Na última sexta-feira, 03 de março, os setores cerâmico e sucroenergético assinaram um acordo visando à paulatina substituição do gás natural pelo biometano como combustível para os fornos das fábricas. Inicialmente, o projeto piloto contemplará dez plantas consumidoras do polo cerâmico localizado no entorno do município de Santa Gertrudes (SP). O prefeito do município, Lázaro Noé da Silva, falou sobre a iniciativa durante a cerimônia de lançamento:
Agora o projeto segue para fase de implementação, com previsão de funcionamento operacional no início de 2025. A princípio, o uso deverá chegar à proporção de 5% do consumo energético das indústrias participantes. Até 2030, a expectativa é que o volume alcance 50% do consumo do setor em São Paulo, o equivalente a aproximadamente 1 milhão de metros cúbicos por dia. À medida que for sendo ampliada a oferta desse combustível processado a partir de resíduos orgânicos das usinas de açúcar e álcool, espera-se que o uso do biometano seja implementado nacionalmente no setor, na cadeia e até em outros setores que poderão aderir à jornada de substituição energética.
O setor cerâmico de revestimento é décimo maior consumidor de energia elétrica no Brasil (2% de participação). Segundo o presidente do conselho de administração da Anfacer (Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos, Louças Sanitárias e Congêneres), Benjamin Ferreira Neto, o acordo representa um novo e importante passo na área energética, com ganhos econômicos e ambientais. O projeto é pioneiro no país, através da associação de dois APLs (Arranjo Produtivo Local) e possibilitará a produção e uso em escala do biometano, o chamado Pré-Sal Caipira. Será um enorme ganho na área sustentável, com diminuição da pegada de carbono, além da previsibilidade de preços e maior segurança energética.
Já para o diretor-executivo do Apla (Arranjo Produtivo Local do Álcool), Flavio Castellari, o setor cerâmico e a sociedade têm a ganhar com essa transição energética. O executivo afirmou que a escolha do setor por uma fonte de energia de baixo carbono é um passo importante para o futuro sustentável. A preocupação ambiental, com a saúde da população, a sustentabilidade e a aposta em energias renováveis é o caminho exemplar que o setor sucroenergético vem trilhando em todo o mundo e o Brasil já é considerado um modelo de sucesso.
A indústria brasileira de revestimentos cerâmicos se movimenta há muitos anos quanto a busca de novas fontes de energia. Com grande foco em inovação, o setor já havia avançado de modo expressivo em termos de produção sustentável, ao adotar o gás natural como combustível. E o biometano é uma tecnologia de ponta já existente e altamente sustentável, com enorme potencial de oferta e insumos disponíveis, inclusive nas entressafras da cana. Esse gás promove a economia verde, em conformidade com os padrões internacionais discutidos na COP 27: diminuição das emissões de dióxido de carbono na atmosfera; gestão inteligente de resíduos orgânicos; produção local, reduzindo grandes extensões de construção de linhas de gasodutos; melhoria da qualidade da vida, por reduzir o lançamento de metano na atmosfera; e contribuição para conter as mudanças climáticas.
Benjamin Ferreira Neto, da Anfacer, fala sobre a iniciativa
Num primeiro momento, por meio da rede já existente de gasodutos, serão injetados 50 mil metros cúbicos diários de biometano nos fornos das empresas, cujo objetivo é contar com um mix de fontes energéticas cada vez mais limpas e renováveis. Nesse sentido, o biometano apresenta grande potencial, até mesmo para suprir 100% da demanda da indústria cerâmica, considerando as elevadas safras de cana e a grande geração de subprodutos do processamento de açúcar e álcool que podem ser convertidos em biogás. Somente em torno da região de Santa Gertrudes são 30 usinas com potencial de fornecimento de 10 a 30 milhões de metros cúbicos por dia. Além da possibilidade de ampliação no volume do biocombustível disponibilizado para a indústria, o acordo permitirá o desenvolvimento de outros usos para o biometano dentro da cadeia produtiva do setor. Um exemplo é a conversão da frota de caminhões utilizados pelas indústrias para transportar a matéria prima das jazidas para as linhas de produção.
A utilização do biometano ampliará o caráter sustentável da produção do setor cerâmico, contribuindo para seu fortalecimento e impulsionamento do processo de reindustrialização do Brasil baseado na economia circular. Com matriz energética de menor impacto ambiental, essa indústria nacional será a mais verde/sustentável do mundo. O aumento do valor agregado da sustentabilidade dos produtos será mais um diferencial para potencializar as exportações.
E diante da alta dependência energética, do desafio do cenário mundial e da relevância da descarbonização para o planeta, o setor tem historicamente se engajado em desenhar possibilidades de mudanças energéticas. Para isso, além da melhoria e implementação de leis e marcos regulatórios, realiza periodicamente missões e visitas internacionais em busca de novas soluções, como as realizadas em 2013 e 2015 nos EUA, 2019 na Bolívia, e a última, em 2022, na Espanha e Dinamarca, com foco em novas tecnologias de uso do hidrogênio e da energia solar.
O setor ocupa posição de destaque no mercado global. O Brasil é o segundo maior consumidor de revestimentos cerâmicos, terceiro maior produtor e sétimo maior exportador mundial. Representa 6% do PIB da construção civil brasileira. É constituído por 60 empresas e 71 unidades fabris, mantendo 28 mil empregos diretos e 200 mil indiretos.
*A repórter viajou a convite da Anfacer (Associação Nacional dos Fabricantes de Cerâmica para Revestimentos, Louças Sanitárias e Congêneres)