Para cumprir as metas do Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica na Amazônia Legal, um estudo lançado pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) nesta quinta-feira, 04 de maio, aponta que será preciso instalar até 12 milhões de módulos fotovoltaicos e baterias nas regiões remotas. A análise também estimou quando e quantos resíduos serão gerados, ressaltando a importância da administração adequada desse fluxo, principalmente em relação às baterias.

O estudo “Sistemas Fotovoltaicos na Amazônia Legal: avaliação e proposição de políticas públicas de universalização de energia elétrica e logística reversa” aponta para dois cenários: mais de três milhões de equipamentos ao longo da vida útil dos sistemas, no caso do atendimento por Sistema Individual de Geração de Energia Elétrica com Fonte Intermitente (SIGFI) de 45 kWh/mês e bateria de íon-lítio e os 12 milhões de equipamentos para o cenário com SIGFI de 180 kWh/mês e bateria de chumbo-ácido.

A análise mostra potencial para 219.221 unidades consumidoras entre residências, escolas, postos de saúde desconectadas do Sistema Interligado Nacional (SIN). Caso a meta do programa seja cumprida, a capacidade instalada total atingirá 363 MWp considerando o padrão SIGFI 45, em 2030. Já no SIGFI 180 a potência será de 1.381 MWp, valor superior a atual capacidade instalada residencial de geração distribuída fotovoltaica (GDFV) dos estados brasileiros.

São Paulo tem a maior capacidade instalada residencial brasileira, com 1.282 MWp, seguido pelo Rio Grande do Sul, com 922,2 MWp. Em outra comparação, se o atendimento for feito apenas por sistemas individuais (SIGFI), esse número representaria 16% da quantidade de sistemas residenciais instalados em todo o país. Ambos os dados são da Absolar, de fevereiro de 2023 e indicam que esse volume também será superior à capacidade instalada de GD solar nas residenciais do Centro-Oeste e Norte.

Para o IEMA, a justa garantia de acesso à eletricidade em comunidades remotas da Amazônia, dependendo da velocidade a ser dada ao processo, exigirá um fornecimento contínuo e estável de componentes para sistemas de geração e os serviços associados. Além disso, o futuro descomissionamento e reposição desses sistemas deve ser feito de forma adequada, a fim de evitar riscos ambientais em áreas sensíveis do local.

“Os resultados do estudo permitem concluir que os desafios no enfrentamento dessas questões são bastante consideráveis, exigindo maior envolvimento por parte dos fabricantes de equipamentos, das distribuidoras de energia elétrica e dos órgãos públicos”, destaca André Luis Ferreira, diretor-presidente do IEMA.

Gestão de resíduos

A previsão da publicação é de que no final da vida útil dos sistemas instalados seriam produzidas entre 71 mil e 237 mil toneladas de resíduos. Apenas o SIGFI 180 com bateria de chumbo-ácido geraria cerca de 7 mil ton/ano, correspondendo quase o dobro dos resíduos eletrônicos coletados no Brasil em 2021. Já os SIGFI 45 a íon-lítio corresponderiam a 2.007,18 toneladas.

Considerando a totalidade de resíduos gerados ao longo do programa Mais Luz para a Amazônia, dividido ao longo dos 32 anos analisados, os estados do Acre, Amapá e Amazonas produziriam a menor quantidade de resíduos anual por habitante. Mato Grosso, Rondônia e Tocantins, por sua vez, seriam os maiores geradores de resíduos por habitante.

O Pará, estado onde há mais unidades consumidoras a serem atendidas, teria 2,2 kg/hab/ano de resíduos com sistemas SIGFI 45 com bateria de íon-de-lítio. Para o sistema SIGFI 180 com bateria de chumbo-ácido, esse valor aumentaria para 7,3 kg/hab/ano. Já Mato Grosso, que tem a menor meta de atendimento, apresenta a maior quantidade de resíduos gerados anualmente por habitante, pois tem menos habitantes por unidades consumidoras. Estima-se a geração de 2,7 kg/hab/ano nos SIGFI 45 com bateria de íon-lítio e 8,9 kg/hab/ano nos SIGFI 180 com bateria de chumbo-ácido.

A pesquisa avaliou dois tipos de armazenamento: chumbo-ácido, já empregada pelo mercado e com preço acessível; e íon-lítio, mais eficiente, porém exige maior cuidado ao manusear e ainda falta ser adequadamente regulamentada pela política de resíduos sólidos brasileira. Assim os resíduos de íon-lítio para atendimento das unidades consumidoras podem chegar entre 37 mil e 61 mil toneladas. Já as baterias de chumbo-ácido podem gerar 90 mil toneladas no sistema de 45 kWh e mais de 110 mil toneladas no segundo cenário.

Ainda que a maioria dos componentes dos sistemas FV seja reciclável, a logística reversa para eles é praticamente inexistente na Amazônia Legal: apenas 58 dos 808 municípios contam com o serviço. Em Tocantins, são apenas dois municípios de 14 e Roraima tem apenas um município entre também 14 com esse recurso.

Os valores presentes no estudo desconsideram a geração de outros tipos de resíduos como embalagens, cabos e componentes dos sistemas. Mesmo assim, o volume estimado pelo trabalho seria superior à atual coleta anual de equipamentos eletroeletrônicos de todo o Brasil.

Logística e falta de informações

Na avaliação do IEMA, garantir o efetivo gerenciamento da instalação e retirada de resíduos dessas regiões remotas requer uma cadeia estruturada. Atualmente mais de 90% dos principais equipamentos de geração solar são importados e a indústria existente está concentrada nas Regiões Sudeste e Sul, com reduzido número de empresas integradoras no Norte do país.

Por fim, faltam informações de medição, monitoramento e planejamento dos sistemas off-grid no Brasil, com a execução efetiva de metas, alocação de recursos e mecanismos de gestão para garantir a sustentabilidade de longo prazo. Esse gargalo também significativo para o acompanhamento, fiscalização e proposição de sugestões, avaliações e melhorias dos programas de acesso à energia elétrica.

“É o caso dos programas de eletrificação, que exigem um ciclo completo de atendimento, desde a identificação e localização das pessoas sem acesso à energia elétrica até a destinação dos resíduos gerados”, explica Vinicius Silva, um dos autores do estudo.

Restam então lacunas a serem preenchidas para o adequado enfrentamento de dois importantes desafios: o planejamento e a execução da instalação de milhares de sistemas off-grid em áreas remotas, distribuídas em um vasto território com pouca infraestrutura logística de transporte e comunicação; e o planejamento e execução da retirada e reciclagem dos resíduos a serem gerados (módulos fotovoltaicos, baterias e componentes) em escala e de forma distribuída.