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Um clima de divergência dificulta a formação de consenso para a resolução de uma série de questões envolvendo novos desenhos de mercado e aspectos institucionais e regulatórios para as tomadas de decisão no setor elétrico brasileiro. Esse é o principal desafio elencado pelo diretor de Estudos Econômico-Energéticos e Ambientais da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Giovani Machado, durante sua apresentação no evento Transição Energética: Gerenciando Riscos e Oportunidades, organizado pela consultoria Marsh McLennan na tarde dessa quarta-feira, 5 de julho, no Rio de Janeiro.

“O maior problema é de software, muito mais do que de hardware. Como vamos sentar na mesa e negociar com um mercado mais aberto, com mais agentes e mais interesses?”, questiona o executivo, afirmando ser preciso construir um jogo que resulte em uma soma positiva, onde todos agentes e o Brasil ganhem um ambiente de previsibilidade e consenso para os investimentos necessários.

Em entrevista à Agência CanalEnergia após o painel, o especialista ponderou ser preciso acertar as questões de calibração do ritmo de saída de subsídios ao setor, citando a necessidade do rebalanceamento de precificação do sistema de forma geral, vendo certa dificuldade até como sociedade em encontrar o equilíbrio dos diferentes interesses que permeiam o segmento. “Se por um lado os incentivos oportunizam acelerar a descentralização e reduzir a emissão de gases de efeito estufa, por outro trazem mais desafios técnicos como o escoamento da transmissão e o crescimento da geração distribuída”, avalia Machado.

Ele reforça ainda que como essas mudanças envolvem impacto na rentabilidade dos mais diversos ativos, não seria algo trivial encontrar a solução se os agentes não toparem uma negociação coordenada, onde todos cedem um pouco. “Se não equacionar esses desafios o sistema não vai se desenvolver como um todo”, pontua, analisando a transição energética como um processo e não uma virada de chave, onde é preciso olhar para as novas tecnologias mas também os modelos de negócio que contemplem todas as capacidades financeiras da população.

Um dos pontos trazidos pela plateia do evento foi sobre a destinação dos componentes da indústria eólica, com a possibilidade de problemas de descarte envolvendo 9 mil turbinas e 28 mil pás daqui 30 anos. Uma opção levantada pelo diretor de Energia da Marsh Brasil, Paulo Mantovani, é que a evolução de processos químicos poderá apoiar na reciclagem de parte desse material que ficará completamente obsoleto.

Já Giovani Machado entende que no curto prazo é preciso haver uma previsão de um fundo abandono para os recursos de tecnologias associadas a essa desmobilização, com as instituições ligadas ao descomissionamento já tendo iniciado essas discussões. “A Suécia está investindo 100% em fontes descarbonizadas, pensando também nessa destinação final, aplicando recursos também na fonte nuclear”, exemplifica, citando que para a neutralidade do Brasil até 2050 o caminho passa por um leque de alternativas para todos universos.

Gás natural

Quanto ao gás natural, o diretor da EPE defende uma visão ampla para o insumo, tendo um conjunto de opções que deve ser balanceado para os riscos sistêmicos e também para apoiar a eletrificação e eficientização das indústrias. Ele lembra que se agora o setor está numa posição confortável com a boa hidrologia, há dois anos as projeções eram de déficit estrutural por vários anos à frente. “As coisas mudam rápido e por vezes temos certa miopia nessa discussão, com o olhar devendo ser mais cuidadoso para o custo de arrependimento não ser alto”, avalia.

Na sua visão o gás tem um potencial que conecta dois mercados, indo para indústria para ser utilizado na cogeração e aumentando a eficiência energética e tendo a possibilidade de ter um excedente de geração para ser colocado na rede e que converge com as necessidades de flexibilidade a depender do setor, com opções de resposta da demanda e injeção na rede com sinais de preço.

Já na avaliação do diretor Financeiro da Engie Brasil, Eduardo Takamori, parece pouco eficiente a ideia de “sujar” um pouco mais a matriz direcionando o gás para dar segurança ao setor elétrico, por essa cadeia precisar de uso contínuo e ininterrupto, levando a crer que seria uma má decisão. Por outro lado, o insumo é muito eficiente para a indústria, sendo de fato preciso empreender uma política para inserção maior do combustível nos processos industriais.

“Colocando mais CO2 na matriz elétrica os produtos derivados também deixam de ser elegíveis para exportação a Europa, já que não serão mais considerados verdes”, ressalta, citando principalmente os segmentos de fertilizantes e alumínio.

Takamori defende a livre a ampla competição tecnológica, visto ela revelar efetivamente preço e eficiência, mas que esse processo deve ter cautela quando a eventual expansão de subsídios, que no passado foram bem-vindos no começo mas não tiveram um fim definido, colocando agora em atenção toda cadeia de geração em função dos preços baixos.

“O principal é redirecionar os esforços e subsídios no segmento de geração, tirando gradualmente e direcionando para o consumo, o oposto do que o presidente Lula tem falado”, comenta, afirmando que a esperança é o surgimento de um alinhamento nas políticas públicas. “Tem que monetizar o gás, expandir as renováveis com transmissão do Nordeste, mas não podemos errar a mão”, acrescenta.

Sobreoferta de energia

Questionado sobre como em um cenário de sobreoferta no país a energia é barata mas a conta é cara, o executivo destacou ser preciso novos desenhos de mercado e a criação de novas demandas, num pacote amplo a ser feito, citando além da realocação dos subsídios a exportação de energia com linhas disponíveis e uma sinalização mais clara ao consumidor do preço da energia, que hoje é definida por modelos matemáticos e que com a migração dos preços ofertados pelos agentes será mais fácil compreensão.

“Operamos o sistema de transmissão de forma conservadora, que faz com que se gere uma série de vertimentos ressarcidos aos geradores e que viram encargos”, complementa o diretor da Engie, concluindo ser necessário um trabalho mais vigoroso visando reduzir as ineficiências da operação do sistema.

Por sua vez, a superintendente de Risco da Neoenergia, Flávia Mesquita Antunes, ressaltou a condição ímpar com a sobreoferta de energia e os avanços na parte de eficiência, com preços favoráveis para a abertura do mercado para 30 a 40% dos consumidores escolherem seus próprios supridores no ano que vem. Ela trouxe em sua apresentação um ranking de transição energética do World Economic Fórum, no qual aponta o Brasil na 14ª posição, pontuando mais em finanças e investimentos e ficando para trás em quesitos como inovação, regulação e políticas públicas.

Para Flávia, o Brasil precisa agir rápido, como no caso das discussões sobre mercado de carbono, além da carga tributária e subsídios dentro do preço da energia. Quando se avalia a transição nas indústrias pela substituição de fornos ou climatização existem dificuldades de financiamento e aporte dos players, por conta do efeito covid ou da taxa de juros. “As empresas de energia não têm capital para financiar toda essa troca de equipamentos necessária”, atenta.

Por fim, Giovani Machado, da EPE, considerou equivocada a visão apresentada pelo índice de que o Brasil está atrasado em vários cenários para a transição, como no caso do hidrogênio, destacando que esses levantamentos gerais e internacionais possuem falhas técnicas, ao considerar diferentes valores de mercado ou até mesmo quanto à moeda em questão, como o dólar em um momento de depreciação do câmbio, que já foi de 3x e chegou a 6x. “Olhando a emissão de CO2 per capita, um brasileiro médio emite 1/3 de um cidadão europeu, 1/4 de um chinês e cerca de 15% de um americano”, finaliza o especialista.