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As 72 termelétricas fósseis conectadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN) emitiram 19,5 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e) em 2022, segundo o 3º Inventário de emissões atmosféricas em usinas termelétricas lançado nessa quinta-feira, 19 de outubro, pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA). A produção proveniente do conjunto das UTEs totalizou 31,1 TWh no ano, diminuindo 67% em relação aos 95,7 TWh em 2021. Apesar dessa redução, a demanda nacional por energia elétrica cresceu 3% entre os períodos.
Dessa queda absoluta, 70,6% vieram da diminuição da operação de ativos a gás natural, enquanto 14,8%, 12,5% e 2,1% da retração do acionamento de usinas a carvão mineral, a óleo combustível e diesel, respectivamente. No ano passado, toda a geração térmica fóssil brasileira voltou a representar os mesmos 10% na matriz elétrica de 20 anos atrás. A redução é reflexo de um período de condições climáticas favoráveis às hidrelétricas após a crise hídrica, além do crescimento de outras fontes renováveis fazendo frente à demanda. A geração eólica ultrapassou pela primeira vez às UTEs e a solar teve um aumento de 80%.
Nesse cenário, o SIN apresentou redução significativa em sua taxa de emissão global, que variou de 92 tCO2e/ GWh em 2021 para quase um terço disso em 2022 (32 tCO2e/ GWh). Independente desses dados aparentemente favoráveis, a tendência é de aumento de emissões por usinas fósseis no médio prazo.
“Como vimos em anos anteriores, períodos de maior ou menor volume de chuvas poderão se alternar no futuro, tornando incerta a continuidade dessa redução de emissões apenas como resultado de condições favoráveis à geração hidrelétrica”, ressalta Felipe Barcellos e Silva, um dos autores do estudo. Em outra análise, desde 2000 a geração fóssil passou de 30,6 TWh para 91,8 TWh em 2020 (representando um aumento de 200%), resultando em uma elevação de 113% nas emissões de gases de efeito estufa do setor elétrico.
O documento do IEMA mostra que 23,3 TWh no ano passado foram produzidos a partir do gás natural (41 plantas), o que corresponde a 75% do total inventariado. Segundo em participação, o carvão mineral foi responsável pela geração de 6,9 TWh, representando 22% da produção de eletricidade fóssil. O aumento proporcional do emprego de térmicas a carvão ocasionou uma elevação de 9% na taxa de emissão média, passando de 582 tCO2e/ GWh em 2021 para 637 tCO2e/ GWh em 2022.
Sul lidera emissões
As quatro usinas que mais emitiram GEE em 2022 foram movidas a carvão mineral e estão localizadas no Sul do país. O destaque vai para Candiota III (RS) que, apesar de ter sido a quinta maior geradora em 2022, foi a maior emissora, responsável por 12% das emissões de todo o parque termelétrico estudado, sendo o empreendimento mais ineficiente. Em setembro desse ano a Eletrobras assinou o contrato para a venda do complexo para o grupo Âmbar Energia.
Outro destaque é o subsistema Sul como maior emissor, perfazendo 40% do total de emissões (7,9 milhões de tCO2e). Isso ocorreu, principalmente, devido à geração carbonífera nos municípios de Capivari de Baixo (SC-20%) e Candiota (RS-19%). Mesmo tendo o menor número de UTEs, a região ultrapassou o Sudeste/Centro-Oeste em emissões. Este foi responsável pela emissão de 5,2 milhões de toneladas de GEE (26% do total).
As emissões de Capivari de Baixo (SC), Candiota (RS), Manaus (AM), Santo Antônio dos Lopes (MA) e Duque de Caxias (RJ) representam quase 70% do montante. No Amazonas, Manaus detém as UTEs que operam com mais capacidade devido a suas características contratuais. Mesmo com a queda relatada de geração de energia elétrica fóssil, as termelétricas do município funcionaram a 57% de sua capacidade máxima, enquanto, na média, as usinas do SIN operaram a 15% de sua capacidade.
No Maranhão, a cidade de Santo Antônio dos Lopes se destaca com o conjunto Termelétrico Parnaíba, que adicionou 365 MW de potência por meio da inauguração de uma turbina a vapor em 2022. Já Duque de Caxias, no Rio de Janeiro, conta com a usina Termorio, a maior geradora de energia elétrica fóssil no ano passado.
Quatro empresas reúnem 75% das emissões
Apesar de haver uma quantidade relativamente grande de empresas geradoras de energia elétrica fóssil (39), quase 75% das emissões inventariadas em 2022 foi de responsabilidade de apenas quatro empresas: Petrobras (22%), Eletrobras (21%), Fram Capital Energy (20%) e Eneva (11%). Na sequência, para completar a lista das dez empresas mais emissoras, estão: Engie (7%), Ceiba Energy (3%), EDF (3%), J&F Investimentos (2%), BTG Pactual (2%) e Termo Norte Energia (2%).
Vale ressaltar que a Petrobras, uma das maiores geradoras de energia elétrica fóssil no país, apresenta uma taxa de emissão menor que a média das empresas inventariadas, sendo a companhia que mais deixou de emitir em relação ao levantamento de 2021, cerca de 10 milhões de tCO2e. Isso se deve, principalmente, à eficiência das tecnologias empregadas em suas termelétricas. “Além da tecnologia de conversão energética (ciclo de potência), a eficiência de uma usina também é afetada pelas condições de manutenção e pela sua idade”, explica o diretor-executivo do IEMA, André Luis Ferreira,
A Engie, por outro lado, liderou as emissões de GEE por eletricidade gerada com 1.156 tCO2e/GWh, quase o dobro da média observada (637 tCO2e/GWh). Em 2022, ela era acionista da Pampa Sul, empreendimento que se destaca negativamente por sua alta intensidade de emissão. Entretanto, em junho de 2023, foi concluída a venda dessa planta para um fundo de investimentos gerido pelas companhias Starboard e Perfin.
Poluição do ar
O inventário também apresentou as emissões de gases poluentes como óxidos de nitrogênio das plantas analisadas, que diferem dos gases de efeito estufa. As dez UTEs com maiores emissões de óxidos de nitrogênio, que forneceram informações à base de dados do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), estão respectivamente localizadas nos municípios de Capivari de Baixo (SC), Duque de Caxias (RJ), Canoas (RS), Cubatão (SP), São Francisco do Conde (BA), Linhares (ES), Alto dos Rodrigues (RN) e Candiota (RS).
Os óxidos de nitrogênio são poluentes emitidos em grandes quantidades por qualquer termelétrica fóssil. Sua presença no ar em concentrações elevadas está associada a uma variedade de preocupações ambientais, como a ocorrência de chuva ácida, e de saúde pública, incluindo enfermidades respiratórias. No entanto, dos 41 municípios onde estão instaladas as usinas que operaram em 2022, 20 não têm estações oficiais de monitoramento da qualidade do ar.
“Isso evidencia lacunas da rede brasileira de monitoramento da qualidade do ar, o que impossibilita a verificação adequada dos riscos à saúde a que estão expostos os habitantes que vivem na área de influência dessas instalações”, comenta Helen Sousa, coautora do estudo.
Ainda assim, na contramão dessa escassez de informações, diversos projetos estão sendo considerados para implementação em locais sem monitoramento da qualidade do ar e onde já há esse tipo de ativo em operação. Além das emissões de gases de efeito estufa e de poluentes do ar, o IEMA observa que a geração termelétrica fóssil provoca uma série de outros problemas ambientais como estresse hídrico por conta da utilização de água para resfriamento de sistemas ou competição no despacho de energia com fontes renováveis.
Ainda na análise do Instituto, o contexto atual do setor elétrico apresenta riscos para seus planos de descarbonização rumo a uma matriz 100% renovável e para a melhoria da qualidade do ar no país. Mesmo sem demanda, nove projetos termelétricos entraram em operação em 2022, oito deles contratados no leilão emergencial de 2021, o chamado Procedimento Simplificado de Contratação (PCS). Somado a isso, a lei da privatização da Eletrobras, Lei 14.182/2021, prevê a instalação de 8 GW em UTEs a gás no Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste até 2030. Já a Lei 14.299/2022 busca a postergação de subsídios e da vida útil de usinas a carvão mineral até 2040.