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O compartilhamento dos custos sistêmicos entre todos, acabando com os “cercadinhos vip”, é o caminho para resolver os sérios problemas de governança que podem levar o setor elétrico ao colapso, na avaliação do ex-diretor geral da Aneel, Jerson Kelman. O especialista foi o convidado do 5º Meet Up virtual da Comunidade CanalEnergia, realizado nesta quarta-feira, 5 de junho.
O tema do encontro foi “Modernização e Futuro do setor elétrico.” E, para falar do futuro, Kelman recorreu ao passado, mostrando como o setor evoluiu de um sistema no qual existiam basicamente hidrelétricas, complementadas por usinas térmicas, para a complexidade de um cenário com maior diversidade de fontes e crescimento da energia eólica e solar.
Para o especialista, o grande problema, em termos de futuro, é que há uma situação de governança do setor muito ruim. Não por culpa das instituições, ressalvou, mas pelo processo de captura do setor elétrico por interesses, seja de lobistas ou de lobistas que se associaram a segmentos políticos. ”Eu vejo com enorme tristeza uma série de decisões da natureza técnica ou de planejamento que entenda quais são as externalidades ou quais são as vantagens de cada segmento, tudo sendo resolvido na base de quem tem um lobby mais forte.”
Crítico dos subsídios, Kelman disse que o setor elétrico foi capturado por “espertezas comerciais e financeiras”, e que a única forma de resolver a transferência de custos de determinados segmentos para o consumidor regulado é a socialização, fazendo com que os custos sistêmicos sejam repartidos com o mercado livre. “Nós temos que achar um caminho para terminar com o cercadinho. Vamos deixar que o povo invada os camarotes, e aí custos sistêmicos terão de ser de alguma forma compartilhados.”
Além da necessidade de mudança no arcabouço regulatório para acomodar uma situação que é diferente hoje do tempo em que as hidrelétricas reinavam, há desafios a serem vencidos. Um deles é de caráter metodológico e esta relacionado às externalidades das fontes de geração. Na visão do ex-diretor da Aneel a questão a ser respondida é qual é a métrica que o setor deve ter para comparar diferente fontes energéticas com características diferentes.
“Aí tem várias ideias que poderiam ser discutidas, mas quando você contrata uma fonte que emite gás de efeito estufa ela não é igual a uma fonte que não emite. Não é igual produzindo com solar, eólica e tal, porque uma emite gases de efeito estufa, outra não emite. E aí você tem a necessidade de achar uma maneira de nivelar essas diferentes características.”
O nivelamento, segundo Kelman, alcança a dimensão ambiental, mas também a comparação dos serviços que são prestados ao sistema por cada fonte. E nessa perspectiva entra, por exemplo, o conceito de usinas hibridas.
Nesse novo mundo, as regras de operação do sistema também tem que ser repensadas. Já é consenso que o papel das hidrelétricas tende a mudar, com a fonte sendo usada para fazer a modulação da carga, em um cenário onde a flexibilidade deve ser valorizada como um atributo importante para o sistema.
Mesmo com a hidrelétricas sendo remuneradas pelo serviço sistêmico delas, é preciso levar em consideração que hoje o despacho dessas usinas têm restrições operativas por conta do uso múltiplo dos recursos hídricos, alerta Kelman. E um dos desafios do setor elétrico é estudar cada uma dessas restrições para saber quais delas poderiam ser ou mitigadas ou eliminadas com algum investimento em engenharia.
Distribuição
Na distribuição, os desafios futuros são muitos, como o garantir uma tarifa que possa ser paga pelo consumidor de baixa renda, incluindo aquele não inscrito no cadastro único dos programas sociais do governo federal. “O meu sonho dourado é que a gente tenha uma solução que combine tecnologia com abordagem social. (…) É preciso que em alguns locais a tarifa social não pode ser com inscrição no CadUnico, porque senão não tem nenhuma chance de ser cobrada e de ser paga.”
Outra questão é compatibilizar a tarifa a ser paga com a qualidade na prestação do serviço e, nessa perspectiva, a estrutura tarifária deveria levar em consideração a qualidade do fornecimento. É preciso discutir também o que é necessário fazer de investimentos, estabelecendo um novo capex das distribuidoras para atender demandas derivadas da eletrificação, principalmente do transporte urbano.
O encontro virtual teve com mediadora Silla Motta, CEO da Donna Lamparina e embaixadora do CanalEnergia.