O Energy Future lançou um relatório que aborda tendências e desafios relacionados ao ESG (Ambiental, Social e Governança) no setor elétrico brasileiro. O documento examinou as principais barreiras e desafios para que o setor elétrico possa liderar, de maneira sólida e abrangente, a transição energética, aproveitando todas as oportunidades que esse caminho inovador pode proporcionar.

Com as alterações climáticas e a necessidade de mudança para uma economia baseada no uso de fontes renováveis, diversos setores precisam investir em ações de descarbonização e neutralidade nas emissões de gases de efeito estufa (GEE). O setor possui uma posição de destaque mundial, já que sua matriz é majoritariamente composta por fontes renováveis. Além disso, o país possui um grande potencial de recursos disponíveis em seu território. Dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) revelam que atualmente mais de 80% da capacidade instalada e da energia elétrica gerada no país provêm de fontes renováveis diversificadas, como usinas hidrelétricas, solares e eólicas. O Brasil é signatário de instrumentos internacionais que estabelecem o compromisso de reduzir as emissões de gases de efeito estufa até 2030 e atingir a neutralidade até 2050.

A transição energética é essencial para que esses objetivos sejam alcançados. Entretanto, essa não é uma tarefa fácil por diversas razões. Uma delas é a necessidade de pesquisa e tecnologia para desenvolver projetos inovadores a fim de superar os desafios técnicos, como a integração de diferentes fontes renováveis à rede, e de melhorar a eficiência energética. De acordo com as previsões da Bloomberg NEF, em 2050 as fontes de energia solar deverão ultrapassar as hidrelétricas, tornando-se predominantes na matriz elétrica brasileira.

Essa transição implica em mudanças significativas no setor, com investimentos em tecnologias e maior conscientização sobre a importância da sustentabilidade em toda a cadeia de valor, para assegurar um futuro energético verdadeiramente seguro e responsável.

O documento também apresenta dados de pesquisa inédita realizada com empresas do setor elétrico brasileiro que revelam um movimento promissor em direção a práticas mais sustentáveis e uma crescente adoção do ESG como parte integrante das estratégias empresariais. O estudo mostra que não falta capital para o desenvolvimento de soluções relacionadas ao ESG: 62% das empresas ouvidas pretendem investir mais de R$ 10 milhões em soluções nos próximos três anos.

Segundo o cofundador e COO do Energy Future, Luiz Fernando Pamplona, o setor elétrico inteiro praticamente reporta segundo alguns dos protocolos internacionais e nacionais que eles adotam. “Então as empresas fazem ali seu relatório de sustentabilidade, fazem reporte para entidades internacionais. Agora, o que a gente precisa mudar, e que eu acho que é uma mudança que tem muito a ver com o desafio de processos, é como que a gente avalia todas as ações e decisões tomadas na empresa também baseado nos impactos ESG que aquela ação ou decisão traz. E isso é muito difícil. Eu não estou falando que é uma dificuldade do setor elétrico, é uma dificuldade do mercado como um todo”, disse.

Ele ainda declarou à Agência CanalEnergia que primeiro é necessário quantificar os impactos ESG de qualquer ação e que já pode ser uma tarefa árdua porque alguns são muito intangíveis. “Mas, no limite, o que a gente quer é que todas as ações tenham seus impactos quantificados e valoradas. Inclusive, esse foi um dos desafios que a gente colocou na nossa chamada setorial. Mas que eu acredito que seja o caminho mais direto e mais eficiente para que as estratégias ESG sejam contempladas também nas estratégias empresariais. Então, isso é um desafio enfrentado por 100% das empresas que a gente ouviu durante o ciclo e a gente baseou muito toda a nossa chamada, todas as nossas discussões em torno desse desafio também. Então a questão ESG é uma debilidade do setor e do mercado, mas é um degrau que vai precisar ser vencido para a gente conseguir ver uma maior adoção do ESG na estratégia empresarial”, explicou.

Quando questionados sobre os motivos que levam empresas a adotar práticas ESG, a pressão dos stakeholders foi a opção mais indicada, sendo selecionada por 59,52% dos respondentes gerais e por 52,63% dos embaixadores do Ciclo de ESG. Em seguida, responsabilidade social e ambiental foi indicada por 16,67% dos respondentes gerais e aumento do valor de mercado por 14,29%.

Já quando o tema são benefícios da adoção de práticas ESG, não houve tanta concentração do resultado: Melhora do relacionamento com os stakeholders (29,84%); aumento da reputação da empresa (24,19%); e atração de novos investimentos (23,39%).

O estudo mostrou que há uma inversão na percepção dos principais desafios para a adoção de práticas ESG no setor elétrico brasileiro. Compreender e abordar os desafios associados ao alto custo, à dificuldade de mensurar os impactos e à falta de visibilidade do retorno financeiro são passos cruciais para impulsionar a implementação eficaz das ações ESG.

“Não falta dinheiro. Faltam propostas bem estruturadas que resolvam problemas reais e relevantes. E, para isso, lançamos, no ano passado, uma Chamada Setorial de ESG em torno dos temas mapeados e priorizados junto a nossos parceiros”, ressaltou Pamplona.

Durante a Chamada Setorial, foram definidos quatro desafios que não apenas endereçam problemas e dores reais e relevantes no momento de hoje, mas que pavimentam jornadas de estruturação do setor elétrico brasileiro em ESG.

Foram recebidas 41 propostas para quatro desafios prioritários: valoração de impactos do ESG no valuation; relacionamento massificado com stakeholders; economia circular para o setor elétrico; e a descarbonização da cadeia de valor nacional.

Para o primeiro desafio, a chamada buscou soluções que tornam a integração de métricas ESG mais eficiente nas estratégias e operações do setor elétrico, facilitando a compreensão dos riscos, acelerando o retorno sobre o investimento (ROI) e permitindo uma associação mais clara entre as práticas ESG e o valuation de novos investimentos. Das sete propostas finalistas, apenas duas se destacaram. A da Verum Partners, com a Rating ESG para novos investimentos, e a Escalab, com a Metodologia de Avaliação de ROI e Valuation Empresarial considerando os impactos das ações de ESG.

O segundo desafio reuniu soluções que unem tecnologia e metodologias sociais, a fim de priorizar um relacionamento ativo e transparente com os stakeholders e as empresas do setor elétrico brasileiro, facilitando a identificação de áreas de melhoria, implementação de práticas sustentáveis e fortalecimento da sua posição no mercado de maneira sólida, competitiva e responsável. Destaque para proposta da startup PiniOn, com o projeto Engajamento, Pesquisa e Informações de Comunidades.

Já o terceiro desafio buscou soluções inovadoras para a redução da extração de matéria-prima e o reaproveitamento de materiais dos setores de geração e armazenamento de energia, aprimorando conjuntamente o desenvolvimento social e a governança corporativa no setor elétrico. Quatro propostas chegaram à final, e apenas uma foi destaque: a da LOGTRONIC Tecnology, sobre Painéis Solares Fotovoltaicos limpos sem água.

E, por último, o quarto desafio buscou soluções inovadoras, eficientes e confiáveis que superem os obstáculos para a eletrificação da economia nacional, com um cauteloso olhar para o setor de transporte brasileiro. Para esse, seis propostas foram finalistas, com dois destaques. A Volt Robotics propôs um Sistema de tarifação dinâmica e inteligente para a recarga de veículos elétricos, e o Instituto Senai de Tecnologia, com a Plataforma de simulação de cenários de veículos elétricos e híbridos para o aumento da adoção.

ESG na prática

Atualmente, algumas empresas participantes da pesquisa e do Ciclo do Energy Future, entre elas, Cemig, Grupo Energisa, Eletrobras, CTG Brasil, SPIC Brasil e Accenture, já se destacam no setor elétrico por serem cases de sucesso em projetos voltados para ESG.

Na questão das práticas ambientais, a Cemig tem sido pioneira na área de inovação, destacando-se no campo da energia solar fotovoltaica. As usinas fotovoltaicas flutuantes representam uma revolução no setor: ao aproveitar corpos d’água, como reservatórios de hidrelétricas, essas usinas otimizam o uso do espaço e, ainda, se beneficiam do resfriamento natural proporcionado pela água, aumentando a eficiência dos painéis solares.

No campo social, a CTG Brasil, em parceria com o Instituto Meio, desenvolveu o programa Usina de Negócios e investiu R$2,4 milhões de recursos próprios para impulsionar o desenvolvimento socioeconômico, empreendedorismo e o aumento na geração de renda com acompanhamento direto da profissionalização e da adoção de boas práticas dos grupos envolvidos nas regiões da Usina Hidrelétrica Jurumirim, no Rio Paranapanema, e da Usina Hidrelétrica Garibaldi, no Rio Canoas, e na região de Arinos, em Minas Gerais.

Há grande foco nos projetos de transição energética e tecnologias de hardware, porém não se vê muitas soluções de tecnologia da informação sendo aplicadas para monitoramento do desempenho ESG das empresas, principalmente no eixo G da agenda. De acordo com estudo da Accenture, chamado “Uniting Technology and Sustainability”, há um desalinhamento entre as estratégias de sustentabilidade e tecnologia adotadas pelas empresas. Apenas 7% das respondentes afirmam ter essas estratégias alinhadas, o que é preocupante dada a necessidade de uma abordagem integrada para impulsionar a transição para uma economia mais verde.

A pesquisa fornece um roteiro para enfrentar os desafios e capitalizar as oportunidades. O setor elétrico brasileiro deve liderar não apenas a produção de energia sustentável, mas também a integração de estratégias tecnológicas, governança e de sustentabilidade, gerando informação tempestiva, de qualidade e capaz de direcionar a estratégia corporativa com a sustentabilidade no centro das decisões.

Por fim, o relatório da Energy Future enfatiza a importância crucial da integração dos princípios ESG no setor elétrico brasileiro, não apenas para garantir a sustentabilidade dos negócios, mas também para promover um futuro mais justo, resiliente e responsável para todos. “Trabalhando juntas, as empresas do setor elétrico podem não só acelerar as mudanças no setor, mas também protagonizar a transformação do potencial brasileiro na liderança global na transição energética”, finaliza Pamplona.