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Um diagnóstico claro e abrangente das áreas onde existem sérios problemas de faturamento da energia elétrica pelas distribuidoras será essencial no desenho de soluções para as diferentes realidades socioeconômicas das concessões de distribuição no Brasil, de acordo com pesquisadores ouvidos pela Aneel em workshop na última quinta-feira, 5 de julho. Embora a definição de tarifas diferenciadas seja vista como uma boa solução para incentivar a regularização de consumidores, a percepção geral é de que o tema transcende o campo regulatório e o próprio setor elétrico.

“Nós estamos falando da oportunidade de fazer experimentação, mas, mais do que sandboxes tarifários, nós estamos falando, sim, de fazer sandboxes que sejam capazes de articular não apenas os diferentes atores envolvidos na arquitetura do setor elétrico, mas também no aparato de segurança pública,” resumiu a diretora do Centro de Estudos de Regulação em Infraestrutura da Fundação Getúlio Vargas, Joísa Dutra.

A realização de experimentos tarifários em ambiente controlado, com o objetivo de reduzir as perdas não técnicas das distribuidoras em áreas mais críticas foi um dos pontos mais discutidos durante o debate.

Angela Gomes, diretora da PSR, saudou a ideia de aplicar tarifas de acordo com o perfil socioeconômico do consumidor, e reforçou a necessidade da visão holística de unir forças muito além do setor elétrico. “A gente viu pelos números que a Aneel trouxe que a gente está perdendo para a perda. O tempo passa e ela não cai.”

O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da UFRJ, Nivalde de Castro, destacou que a aplicação de tarifas diferenciadas prevista no decreto com as diretrizes para prorrogação das concessões de distribuição abre a possibilidade de uma regulação mais flexível, a partir das conclusões de projetos piloto.

Castro comemorou a determinação da Aneel de aprimorar a metodologia de perdas em 2025. Ponderou, no entanto, que há um cenário para avançar na regulação por incentivos, mas ela só é eficaz nas áreas que não estão dominadas pelo crime organizado. “Este é um problema de segurança pública. Aqui, há uma falha de mercado. Que falha? A falta do Estado.”

A pesquisadora da FGV Joana Monteiro, que trabalha há oito anos analisando a ação de grupos armados na ocupação de territórios, defendeu uma nova abordagem para o problema. Ela considera fundamental reduzir a capacidade de coerção desses grupos, que estão entranhados na própria estrutura do Estado, e  aponta a necessidade de mecanismos de controle das forças de segurança pública e do Judiciário, para monitorar o que esses agentes estão fazendo.

“São firmas muito lucrativas que tem monopólios locais de atividades ilícitas e lícitas. Tem controle do território e muitas vezes tem apoio politico,”, disse Joanna. Para a especialista, o setor elétrico tem que investir em medição do problema, por meio de um projeto de pesquisa e desenvolvimento, para entender melhor a atuação criminosa no negocio de distribuição. “Estamos perdendo muito dinheiro nisso.”

A diretora da Aneel Agnes da Costa afirmou que deve haver coordenação entre atores diversos, como forma de traçar um diagnostico consistente, com granularidade do ponto de vista da informação. A agência reguladora pode estabelecer para as concessionárias um mapeamento das áreas de concessão, atuando talvez apenas na padronização de procedimentos.

“Tem que separar as areas para dar um tratamento diferente. A agência sozinha pode não resolver, mas pode bater nas portas com a informação debaixo do braço para isso.”

Richard Hochstetler, diretor do Instituto Acende Brasil, lembrou que uma ação no sentido de recuperar territórios dominados por grupos armados, como acontece no Rio de Janeiro, é uma ação que extrapola a atuação da Aneel. “É uma batalha que a gente tem realmente de unir todas as partes – Judiciário, Executivo, influenciadores em geral.”

Para o gerente de Planejamento e Inteligência de Mercado da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, Lindemberg Reis, o problema das perdas tem pelo menos oito aspectos a serem considerados. São eles: o regulatório, que precisa ser revisado; o social, que tem a ver com as disparidades entre as concessões; o financeiro, relacionado à disponibilidade de pagamento; o jurídico, com o envolvimento do Judiciário na solução; o político, marcado por demandas controversas, como a proibição da medição centralizada em Manaus (AM); o tecnológico e o da comunicação com os diferentes públicos.

Reis defendeu novos debates sobre o tema das perdas, que ele considera multidimensional. Lembrou que a Aneel conseguiu reunir boa parte dos atores que devem ser ouvidos, mas alguns ficaram fora da discussão. “Uma reflexão que a gente faz aqui é que o combate às perdas é uma força tarefa nacional, não é do setor elétrico.”