O curtailment, ou corte de geração renovável, é um problema grave para o setor, mas nem de perto se assemelha ao GSF. Na pior das hipóteses calculadas pela Volt Robotics, o valor das perdas do setor chega a R$ 1,6 bilhão ao considerar a redução da receita dos geradores mais o custo das térmicas que têm que ficar ligadas por horas seguidas, já que são pouco flexíveis. O tema foi alvo de um painel no evento que reuniu diversos geradores renováveis afetados pela restrição.
De acordo com o diretor geral da empresa, Donato Filho, no último trimestre, o custo das térmicas chegou a R$ 1,3 bilhão. Segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico, o volume de cortes é de cerca de R$ 200 milhões, mas se considerar contratos envolvidos a perda aumenta para R$ 680 milhões.
“O curtailment nunca chegou a 1% do setor elétrico, então não podemos dizer que é um novo GSF, mas a forma de ressarcimento está equivocada”, destacou ele em sua participação na 15ª edição do Brazil Windpower. “Apesar disso, houve uma usina que teve corte de 77% de sua produção”, ressaltou ele, lembrando que o assunto é importante sim.
O presidente do Conselho de Administração da ABEEólica, Fernando Elias, destacou que esse é o maior problema que o setor de geração eólica enfrenta no momento. E que esse assunto não é novo, já é discutido desde, pelo menos, 2013. Ele comparou o contingenciamento feito há um ano pelo ONS na chamada operação conservadora do SIN desde agosto de 2023, após a ocorrência no Nordeste como se fosse o mesmo que desligar uma usina de Itaipu por 3 meses. E reforçou que é necessário que a política de cortes não onere o gerador já que essa é uma contingência do sistema e não do empreendedor.
Élbia Gannoum, presidente executiva da ABEEólica, lembrou que o setor ficou bastante insatisfeito com a regulamentação da lei de 2004 que tratou do assunto. Isso porque as regras não trouxeram a esperada correta alocação de risco sobre aquele que pode gerenciar a operação e o corte que são os geradores.
“O setor está padecendo com a falta de alocação adequada de riscos. Além dessa discussão no âmbito regulatório e em âmbito judicial, fizemos outras ações e mais recentemente com o ONS, MME e Aneel”, disse. “A solução é complexa e o trabalho que estamos desenvolvendo visa levar os nossos pleitos que tratam de ter o risco e o custo alocados onde eles devem estar”, apontou a executiva. “Em 2025 essa realidade de cortes de geração de energia não poderá se repetir de forma nenhuma”, avisou.
A advogada sócia administradora do escritório Julião Coelho Advocacia, que representa a entidade na ação que tramita na justiça, Camila Alves, destacou que são 1300 usinas representadas na ação, o que mostra o alcance dessa questão. Inclusive, ela comparou que o momento pelo qual o setor vive, apesar de não chegar ao valor de um GSF como o diretor da Volt Robotics aponta, assemelha-se àquele pré-disputa pelo GSF que chegou a um valor de mais de R$ 10 bilhões travados na CCEE na liquidação financeira do mercado de curto prazo.
Ela se refere à tentativa de buscar o diálogo pelos envolvidos naquela oportunidade, mas que não houve reverberação junto ao poder concedente. “A primeira reação institucional naquele período foi a de que o problema existia mas o risco era desproporcional. Estamos com o mesmo clima, apesar de não ser igual, mas estamos com mesmo estágio inicial de 2014 e 2015 com certa negação inicial das instituições”, relembrou.
Liu Aquino, diretor presidente da Echoenergia, corroborou a avaliação de que o risco está em nível elevado, ainda mais em um cenário de investimento. Para ele, é necessário corrigir a regulação e fazer a alocação correta. Segundo o executivo, o avanço descoordenado da MMGD acaba levando os cortes somente para a geração centralizada, porque, naturalmente, o ONS só possui capacidade de controlar esse lado da oferta de energia.
Em sua participação, Gustavo Estrella, CEO da CPFL, empresa que também tem notado o impacto do curtailment em seus parques renováveis, lembra que essa questão da segurança energética não é apenas vista no Brasil. É uma questão mundial porque os países caminham na busca pela redução das emissões de carbono.
“Estive na China recentemente e eles alcançaram 30% da matriz elétrica de renováveis, mesmo por lá já estão discutindo os efeitos do curtailment, imagina aqui no Brasil se isso não aconteceria diante da renovabilidade de mais de 80% que temos”, contou. Ele aproveitou e voltou a defender a busca, além da alocação desses custos, por novos grandes consumidores como para a produção de hidrogênio verde e data centers.
Por fim, João Marques da Cruz, CEO da EDP South America, avaliou que experiências internacionais podem sim ser usadas como referência no país nessa busca pela solução. Entre os caminhos aponta a regra de ressarcimento que por aqui é quase inexistente. Comparou um dado da EDP nos Estados Unidos que em 9 meses do ano de 2024 a empresa conseguiu ressarcir 20% dos eventos registrados no país norte-americano. “Foi 20 a 0, nos Estados Unidos ficou em 20% e no Brasil ficou zerado”, comparou.
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