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A publicação do Decreto 10.946/2022 que estabelece as diretrizes para a fonte eólica offshore no Brasil é considerada positiva e foi comemorada por diversos interessados no tema. Em geral, a avaliação é de que o texto agrega segurança jurídica ao tema e ainda que elimina incertezas ao sinalizar ao investidor que o Brasil considera esta modalidade de geração como parte integrante da matriz elétrica nacional em um futuro próximo.
O movimento dado pelo governo federal é apenas o início de um processo de mais longo prazo. Até porque as regras complementares de que dispõe o decreto ainda deverão ser elaboradas e conhecidas em um ano. É necessário ainda que a Aneel regule o assunto por meio de portarias. E mais do que isso, há a incerteza ainda acerca do tamanho do mercado.
De acordo com a presidente executiva da Associação Brasileira da Energia Eólica, Élbia Gannoum, esse decreto já era esperado desde dezembro do ano passado. E ainda, representa um passo importante para a fonte. Em sua análise, com o decreto em vigor, fato que acontecerá em 15 de junho, o investidor saberá qual caminho deverá seguir.
Contudo, lembra que ainda é o primeiro passo. Ela voltou a defender um leilão específico para a fonte que poderia ser, inclusive por meio da contratação de energia de reserva, uma vez que projetos offshore são de grande porte, diferentemente daqueles localizados em terra.
“Eu gostaria de estar errada, o mercado poderá provar isso, mas é difícil começarmos na eólica offshore por meio do mercado livre. São bilhões de reais em investimentos e precisamos de contratos de longo prazo. Acho importante que o governo dê esse sinal para iniciarmos a indústria, não é apenas energia elétrica limpa e renovável, estamos falando de uma nova indústria que precisa por isso de uma política pública”, comentou a executiva em coletiva para abordar a publicação do decreto.
Inclusive, acrescentou que o preço de referência para a eólica offshore está na casa de US$ 100 por MWh sem a transmissão. Esse valor, destaca, está até mais abaixo do que a energia da RSU que estreou no último leilão de energia nova, em 2021.
O advogado Raphael Gomes, sócio da área de energia do escritório Lefosse Advogados concorda que o Decreto traz segurança jurídica. Fato que segundo ele, não havia antes dessa indicação uma vez que há diferentes segmentos e regramentos quando o assunto trata de empreendimentos em ambiente marítimo.
Apesar de existir o Termo de Referência do Ibama não existia uma norma que garantisse a segurança para o investidor de que aqueles termos não mudariam. Inclusive ele cita que uma empresa norueguesa que ele não indicou o nome, apontava que a sobreposição da regulação sobre o tema era um dos pontos que mais afastavam-na de aportar em eólica offshore no Brasil.
Sobreposição de competências em regulação trazia insegurança para investidores. Decreto organiza e direciona o caminho. Raphael Gomes, do Lefosse Advogados
“Essa sobreposição de regras leva a uma situação em que outro órgão pode pedir revisão de uma exigência de outro, é o caso por exemplo para instalar um navio de regaseificação em porto no Brasil”, destacou ele ao lembrar de um caso que teve conhecimento. Com o decreto há uma organização nessa questão, disse ele, mas lembra que ainda há muita coisa a se tratar até que se tenha a energia eólica offshore em operação no país.
Investidor nessa área há 20 anos, Marcelo Storrer, advogado e fundador da Asa Branca Energia Eólica, defende por sua vez que o arcabouço regulatório já existia no Brasil. “O que não existia era uma consolidação das regras. O conjunto de regras já existe, mas estavam bastante dispersas. O decreto deu um comando claro e específico que ajuda a ter mais segurança jurídica, este um fato que já existia”, defendeu.
Portanto, argumentou ele, o decreto é positivo sim, mas pelo fato de minimizar a insegurança causada no mercado. A publicação sinaliza de fato o interesse do país na fonte.
Arcabouço regulatório já existe, acontece que estava disperso em diversas leis, o decreto consolida esse conjunto de regras. Marcelo Storrer, da Asa Branca Energia Eólica
Inclusive cita que o projeto já tem autorização para uma área na conta do Nordeste, no Ceará de 3.600 quilômetros quadrados. A ideia é a de desenvolver até 11 GW eólicos naquela região onde a lâmina de água é de seis metros. Mas lembra que as dificuldades não estão apenas na instalação e operação, a logística é um ponto crucial nesse processo. “O projeto é integrado e pressupoe a ampliação de Pecém e um terminal próprio com 50 hectares de área que envolve a construção de uma nova ilha naquele local.
Serão 10 módulos de pouco mais de 1 GW, o primeiro projeto é estimado em 1.080 MW, mas ainda sem previsão de operação. A empresa contratou a Ramboll para realizar os estudos para a obtenção do licenciamento ambiental, um investimento de R$ 20 milhões. A ideia é de usar turbinas de 15 MW de potência instalada.
Em paralelo, conta ele, estão conversando com duas empresas em uma due dilligence para que entrem como sócias no empreendimento. Segundo Storrer, o decreto pode ajudar a mostrar que o Brasil está mais atrativo ao investimento e facilitar a chegada de mais investidores no setor.
Potencial
Atualmente, dos 23 processos de licenciamento ambiental no Ibama, a proposta é a instalação de 3.486 aerogeradores, totalizando 46.631 MW. Segundo a presidente da ABEEólica, esse volume de projetos que já estão no órgão ambiental já supera os 50 GW de potência.
Mas a visão inicial é de que a partir de 2027 é que teríamos os primeiros projetos. Mas a data ainda é incerta. Pelo que aponta a executiva 2030 poderia ser uma possibilidade mais real. Ela cita que nas conversas sobre os leilões há uma ideia de que se contrate um leilão com características de A-7. Ou seja, se a expectativa de leilão se concretizar em 2023 apenas, a operação se daria na virada da década.
Ibama já registra cerca de 50 GW em projetos de geração eólica offshore
Ela cita ainda a falta de perspectivas de conexão desses parques com o continente como uma das dificuldades atuais. Mas ressalta que o atual nível da cadeia produtiva local é suficiente para atender o momento inicial do desenvolvimento da fonte por aqui. Cita o fato de que duas das fabricantes com unidades fabris no país já possuem atuação nessa fonte em outras regiões do mundo.
Outro ponto que Élbia descarta é a concessão de subsídios. Ela lembra que hoje não é necessário um programa específico como o Proinfa para estimular a fonte. Um leilão específico, dispositivo que não existia à época do programa citado, é o suficiente.
Tomando como base na experiência internacional, a visão é de que o Brasil pode ser um dos líderes da geração eólica offshore diante do potencial que o litoral do país possui. Na avaliação do CEO do Global Wind Energy Council, Ben Backwell, há pelo menos três grandes ‘bacias’ de ventos que estão estrategicamente localizados.
Esses projetos podem estar próximos aos centros de demanda. Um deles está no Nordeste, na faixa de São Luiz (MA) a João Pessoa (PB). A segunda entre Vila Velha (ES) e ao sul do Rio de Janeiro e outra no Sul que vai do Uruguai a Florianopolis (SC). Essa característica pode ajudar o país a enfrentar uma queda de custos que não deverá ser mais tão acelerada como nos últimos cinco anos.
“O Brasil tem todas as condições se se tornar líder da eólica offshore. O país possui um grande potencial sem limites, um estudo do Banco Mundial identificou um volume teórico de 1,2 TW de potencial técnico”, lembrou ele em entrevista à Agência CanalEnergia.
Além disso, Backwell destacou a experiência brasileira com a exploração marítima derivada do setor de petróleo e gás em águas profundas, fator que é considerado importante nessa indústria.
Backwell indicou ainda pontos que estão em alta em termos globais como as novas tecnologias que se utilizam do hidrogênio verde para uso em substituição a fontes fósseis. E que nesse sentido, a eólica offshore é uma fonte que vai ao encontro dessas necessidades.
Com essa combinação de potencial de geração e mercado, o país pode ser um hub de exportação. E ainda citou que há propostas de estados brasileiros que tem a intenção de exportar o produto. “Brasil tem boas condições para desenvolver a demanda nacional e internacional”, reforçou.